Eis a terceira publicação da série Compliance na história. No primeiro texto, conhecemos os principais acontecimentos que contribuíram para o germinar da temática, entre 1900 e 1950. No segundo, dos anos 1960 até 1990, vimos o nascimento da área, os escândalos nos Estados Unidos e o cerco ao sistema financeiro.
Hoje vamos apresentar como o Compliance permeou o combate à lavagem de dinheiro, entre 1990 e 2000. Esse conteúdo integra o Compliance Handbook da Interact, um material de 130 páginas que contempla o histórico, os fundamentos conceituais, a legislação brasileira, os principais modelos no mundo e como o SA Strategic Adviser atende a essas recomendações. A pesquisa elaborada pela Interact baseou a criação da solução em tecnologia Compliance & Gestão de Riscos.
Sem mais delongas, desejamos uma proveitosa leitura.
Combate à lavagem de dinheiro – 1990-2000
Mais do que uma realidade, Compliance passou a ser uma necessidade nessa fase. Inicialmente voltado para o setor financeiro, paulatinamente começa a perpassar distintas áreas por conta de exigências legais, requisitos de comércio e benefícios em competitividade a longo prazo.
Em contrapartida, a lavagem de dinheiro começou a assumir diferentes facetas, o que demandou dos países mudanças em seus ordenamentos jurídicos. O Foreign Corrupt Practices Act (FCPA) é considerado o propulsor nesse período da adoção de políticas mais rígidas contra a corrupção por parte dos países-membro das Nações Unidas.
De acordo com Leopoldo Pagotto (2013, p. 27), a vedação do suborno internacional com o FCPA foi um prejuízo inicialmente para empresas norte-americanas, já que o pagamento indevido a funcionários públicos estrangeiros era “uma prática relativamente comum”. Um relatório do departamento de Comércio dos Estados Unidos de 1996 estimou uma perda de US$ 11 bilhões em negócios nos anos anteriores com a legislação.
Por essa razão, era essencial para eles que os demais países industrializados também aderissem ao combate ao suborno e, em última instância, ao Compliance. Por conter o maior montante de nações industrializadas, a Europa justamente se obrigou a entrar nessa ambiência de adequações.
Mecanismos de combate
Em 1990, o Grupo de Ação Financeira Internacional Contra Lavagem de Dinheiro – GAFI (Financial Action Task Force on Money Laundering – FATF) publicou 40 recomendações a serem seguidas pelos países no combate à lavagem de dinheiro, de aplicação universal. Elas não têm força de lei, uma vez que a entidade reconhece a soberania das nações. No mesmo ano, é criada o CFATF – Caribbean Financial Action Task Force para combater a lavagem de dinheiro nos paraísos fiscais do Caribe (ABBI, 2009).
Já o Conselho da Europa, organização intergovernamental, passou a exigir que os signatários criminalizassem a lavagem de dinheiro e estabelecessem medidas legais de embargo e confisco. A aplicabilidade abrangeu outros países para além da Europa. As decisões entraram em vigor em 1993.
Em 1995, Unidades de inteligência financeira do mundo inteiro criaram o Egmont Group of Financial Intelligence Units, em Bruxelas, na Bélgica. Na mesma oportunidade, foi lançado pela entidade o fórum de apoio aos programas de combate à lavagem de dinheiro. Atualmente, contempla um corpo de 159 unidades de inteligência financeira que combate a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo.
Em 1997, a OCDE realizou a Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, em Paris, na França. Os países signatários se comprometeram a adotar medidas anticorrupção, o que representou a adoção de medidas de self compliance pelas empresas. O intuito era criar uma cultura de cumprimento de diretrizes legais e regulatórias (SARCEDO, 2014). O Brasil promulgou a convenção com o Decreto nº 3.678, em 2000.
Compliance no sistema bancário
Compliance no sistema bancário
Em 1997, o Comitê da Basileia lançou o documento Core Principles for Effective Banking Supervision, com princípios universais para o fortalecimento do sistema financeiro, com destaque para o princípio 14 na versão de 1997 e o princípio 17 na revisão de 2006. Essa foi a primeira vez que o Compliance foi mencionado de forma explícita pelo organismo.
Princípio de n.º 14: “Os supervisores da atividade bancária devem certificar-se de que os bancos tenham controles internos adequados para a natureza e escala de seus negócios. Estes devem incluir arranjos claros de delegação de autoridade e responsabilidade: segregação de funções que envolvam comprometimento do banco, distribuição de seus recursos e contabilização de seus ativos e obrigações; reconciliação destes processos; salvaguarda de seus ativos; e funções apropriadas e independentes de Auditoria Interna e Externa e de Compliance para testar a adesão a estes controles, bem como a leis e regulamentos aplicáveis” (THE BASEL COMMITTEE, 1997, p. 30, grifo nosso).
Em março de 1998, foi publicada a Lei nº 9.613, que versa sobre crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores e a utilização do sistema financeiro para tais atos. Entre as disposições, criou o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), antigamente situado no âmbito do Ministério da Fazenda e hoje alocado no Ministério da Justiça. A finalidade do órgão é disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas.
O Comitê da Basileia publicou o Framework for Internal Control Systems in Banking Organisations – 13 principles for the Assessment of Internal Control Systems. O documento se voltava para a necessidade de controles internos efetivos e a promoção da estabilidade do sistema financeiro mundial. A palavra compliance é mencionada 21 vezes na publicação (THE BASEL COMMITTEE, 1998).
O Brasil adotou as diretrizes desse documento no mesmo ano. O Conselho Monetário Nacional publicou a Resolução 2.554, de 24 de setembro de 1998, que dispõe sobre a implantação e implementação do sistema de Controles Internos. Sobre ética, integridade e controles internos, o documento traz a seguinte menção:
“Art. 4º Incumbe à diretoria da instituição, além das responsabilidades enumeradas no art. 1º, parágrafo 2º, a promoção de elevados padrões éticos e de integridade e de uma cultura organizacional que demonstre e enfatize, a todos os funcionários, a importância dos controles internos e o papel de cada um no processo” (BANCO CENTRAL DO BRASIL, 1998, p.5).
Autor: Vinícius Flôres
Referências
ABBI. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS BANCOS INTERNACIONAIS – Cartilha Função de Compliance, 2009. Disponível em: www.abbi.com.br. Acesso em: 1 fev. 2019.
BANCO CENTRAL DO BRASIL. Resolução 2.554. Brasil, 1998. Disponível em:
https://www.bcb.gov.br/pre/normativos/res/1998/pdf/res_2554_v3_P.pdf Acesso em: fev. 2019.
PAGOTTO, Leopoldo. Esforços Globais Anticorrupção e seus reflexos no Brasil. In: DEBBIO, Alessandra Del; MAEDA, Bruno Carneiro; AYRES, Carlos Henrique da Silva (Coord.) Temas de Anticorrupção e Compliance. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.
SARCEDO, Leandro. Compliance e Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica: Construção de um novo modelo de imputação, baseado na culpabilidade corporativa. Tese de Doutorado. Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2014.
THE BASEL COMMITTEE. Core Principles for Effective Banking Supervision. Basileia, 1997. Disponível em: https://www.bis.org/publ/bcbsc102.pdf Acesso em: fev. 2019.
____________________. Framework for Internal Control Systems in Banking Organisations. Basel, 1998. Disponível em: https://www.bis.org/publ/bcbs40.pdf. Acesso em: fev. 2019.